sexta-feira, 10 de novembro de 2006

O Poder do Estado e a Soberania no Século XXI

O Poder do Estado é uno e indivisível. Dentro dos limites territoriais do Estado, não reconhece nenhum outro superior ao seu. Na sociedade internacional de países, os Estados se reconhecem como iguais. Estas são as linhas mestras do ensino da disciplina de Teoria Geral do Estado.

Durante todo o século XX, estudantes de Direito tiveram por paradigmas as noções de soberania e poder estatal como instrumentos de controle e organização sociais, na gestão/organização/direção da coisa pública e da própria sociedade política. Sendo o Poder estatal uno, superior, indivisível e inalienável, doutrinas foram as que tentaram justificar a sua concentração nas mãos de uma minoria - mais apta à exercer o domínio social (soberania nacional) -, ou a divisão desse poder entre os homens e mulheres do povo (soberania popular). Daí, desta última, se organiza o sistema representativo da democracia semidireta que conhecemos no País, atualmente, que tanto traz dúvidas quanto à sua efetividade e quanto à praticidade/eficiência de seus instrumentos.

Sendo o Estado um substituto entre os cidadãos, agindo como mantenedor da sociedade de particulares, todas as vezes que esta não encontra as condições necessárias para se desenvolver sozinha, ou atuando na resolução dos conflitos sociais, o Estado age de forma a compor conflitos ou realizar as condições materiais necessárias à subsistência da sociedade. Assim, organiza suas funções: administrativa, judiciária, executiva. Cada uma delas se reveste de autoridade - e não de Poder. Explico. Primeiro, os órgãos que exercem estas funções estatais são ocupados por pessoas físicas. Segundo, essas pessoas estão lotadas e/ou investidas em cargos, como representantes do Estado - tendo em vista o fim do poder pessoal das pessoas que ocupam as funções públicas, que nos remete ao extinto Estado absolutista. Terceiro, esses funcionários e agentes públicos estão submetidos ao controle do ordenamento jurídico. E, por fim, sendo funcionários ou agentes, retirando a competência para executar suas atribuições funcionais diretamente da lei e estando submetidos ao princípio da legalidade, todas as vezes que praticam atos atentatórios ao Direito e nocivos à sociedade, podem ser submetidos ao controle jurisdicional de seus atos. O detentor do Poder é o povo, nos termos da Constituição Federal. Se os políticos eleitos não são os "donos do Poder", mas meros representantes, imagine um agente policial ou fiscal admnistrativo - classes que constumeiramente abusam da pequena esfera de autoridade que possuem. Quando essas pessoas praticam atos de violência ou estrapolam o exercício de sua atividade, estão cometendo ou abuso de autoridade, ou desvio de finalidade, e não abuso de Poder - porque Poder não têm, embora muito desejem-no.

Entretanto, mudanças nas relações econômico-sociais e tecnológicas trouxeram um novo modelo às relações sócio-jurídicas, tanto no que pertine à intersubjetividade dos cidadãos entre si, como entre os cidadãos e o Estado e, ainda, nas relações dos países no plano internacional. Entre os particulares, veja-se o fenômeno do poder de fato das organizações criminosas e do para-estatismo da organização social das favelas nas grandes capitais do Brasil, por exemplo. Se a teoria jurídico-política admitia aqueles valores iniciais, citados alhures, como elementares e direcionadores da atuação estatal, o cenário atual demonstra uma complexidade que exige do cientista político uma revisão profunda desses conceitos. Sabe-se que países com extrema força militar e econômica determinam o destino de milhares ou milhões de habitantes de outros países, vez que controlam-lhes a economia e/ou liberdade; cai por terra ou se torna puramente ideológica qualquer pretensão que alegue igualdade entre os Estados na comunidade de países ou que coloque a soberania popular como força predominante nas sociedades capitalistas contemporâneas - principalmente quando considerado o fenômeno das empresas multinacionais, que detém capital superior ao P.I.B. de centenas de países ao redor do mundo e que podem facilmente condenar toda a estabilidade social de um Estado subdesenvolvido.

De fato, muito se debate, atualmente, acerca de uma nova noção de soberania que seja capaz de explicar quais seriam seus fenômenos concretos - e não meramente ideais. Neste diapasão, as organizações internacionais de países e seus tribunais são ferramentas jurídico-políticas representativas dos interesses dos Estados que, cada vez mais, afirmam seu papel predominante na determinação dos rumos do governo dos países - que o digam o F.M.I. e o B.I.D., do lado privatista, e a O.N.U. ou U.E., do lado publicista. Seja como for, o Estado tem sua atuação soberana cada vez limitada por fatores de ordem jurídica e de contingência econômica, que retiram-lhe o Poder da forma como este foi concebido desde Hobbes e Rousseau até Norberto Bobbio. Hoje, muito mais do quê auto-determinação, existe uma crescente imposição de padrões mínimos e modelos sócio-econômicos globalizantes que demonstram uma tendência à harmonização de legislações entre os países e que insiste numa universalização de costumes e culturas.

Mas, uma coisa é certa: assim como não se pode "confundir alhos com bugalhos", nem "capitão de fragata com cafetão de gravata", o mínimo que um bom jurista pode fazer é inteligir acerca das teorias do passado (da soberania), para entender o atual estágio e o que vem pelo futuro (a globalização e a supranacionalidade). Senão, ficará atrelado aos "achismos" e "acreditismos" de fundamentação ideal-dogmática.

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