segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Crime organizado e Estado polícia

Não é de hoje que o cidadão comum percebe que o crime organizado domina diversos setores da Sociedade brasileira. Os criminosos, membros de quadrilhas altamente especializadas em crimes de vário gênero, podem ser agentes políticos e funcionários públicos, integrantes das Forças Armadas ou membros da sociedade civil, profissionais liberais ou proprietários de grandes empresas.

O que favorece essa imersão do crime profissionalizado na vida social? A resposta é complexa, pois, embora esteja contida nas simples palavras corrupção, omissão e descaso, ela esconde a participação ativa e bem gerenciada de membros do Legislativo, chefes e secretários do Executivo e integrantes do Poder Judiciário - todos "trabalhando" no sentido de promover a "farra" com a coisa pública.


Contrapondo-se a essa lógica, encontra-se a Sociedade civil aterrorizada. Insegura e entregue ao medo, ela está pronta a ceder sua liberdade em nome da repressão às entidades criminosas, através do uso da violência institucionalizada do Estado. É a repetição de um ciclo histórico brasileiro, de alternância de extremos (repressão e libertinagem), que demonstra a inaptidão tupiniquim em copiar os modelos de organização política europeus - quer por questões culturais, quer pelo que diabo quer que seja.

Nesse sentido apontam as promessas eleitoreiras das eleições legislativas federal e estaduais de 2010: um sem-número de candidatos apontando no sentido de um Estado polícia oblíquamente intolerante, que toma o resultado (violência) pelas causas (pobreza), apostando na violência para conter a violência -- a última que ouvi foi a seguinte: "(...) vote em mim, porque do pescoço para baixo é 'canela' (...)".

Entretanto, convém esclarecer o seguinte: a segurança prometida por esse Estado polícia, em (re)construção no Brasil, não solucionará o problema do crime organizado, senão se concentrará apenas naquele tipo de crime que satisfaz à pequena parcela da Sociedade preocupada com as normas jurídicas típicas do Título I da Parte Especial do Código Penal - "Dos crimes contra a pessoa" (homicídio, furto, roubo etc).

Isso porque os delitos do crime organizado são praticados com o apoio indireto das próprias instituições estatais. Só essas organizações criminosas são capazes de utilizar tanto a infraestrutura, quanto a superestrutura estatais de forma eficaz e perene, garantindo a continuidade de suas atividades; elas são as únicas capazes de dispor de recursos financeiros suficientes para suprir os diferentes tipos de "custos de manutenção" de que o crime depende: subornos e propinas, contratação de boas firmas de advogados, assassinato de testemunhas, destruição de provas e evidências e etc.

Portanto, o crime organizado e o Estado polícia são composições simbióticas, uma dependendo da outra para conter o "crime de colarinho azul" -- praticado pelo "ladrão de galinhas", do qual falava Rui Barbosa. Esta simbiose oprime o crime não-profissional e assegura a manutenção do terror das pacatas famílias brasileiras, temerosas por seus bens e vida. Esta relação entre crime e poder social funcionará como mecanismo de manutenção da apatia política e da cidadania inerte.

Um comentário:

  1. Esse seu artigo mostra que é impossível a separação do ser político do ser social. Contudo, quanto mais se encobrir as verdadeiras causas dos males individuais e coletivos, os efeitos serão tomados como causas e, por conseqüência, sabemos que não se corta uma arvore pelos frutos.

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