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terça-feira, 9 de dezembro de 2014

O Político e o Professor

Desde as eleições recentes (outubro de 2014), as redes sociais têm sido espaço para a verborreia do ódio e do descontrole, intercalado apenas pelo bom senso de poucos, que tentam contemporizar e trazer à tona a racionalidade e a cidadania, necessários ao desenvolvimento pleno da Democracia brasileira. Porém, a Internet tem sido apenas o palco, onde os personagens multiplicadores desses sentimentos vis e antidemocráticos funcionam como fantoches de forças e grupos com intensões bem claras, e objetivos políticos concretos.
Para compreender o "estado da Nação", é preciso que se reconheça que os ânimos se acirraram, principalmente após a vitória apertada da atual Presidente da República - legitimamente eleita mediante pleito eleitoral, por escrutínio secreto e universal. Depois de encerradas as eleições, ao contrário do que se poderia imaginar - com a reorganização das forças políticas em torno de questões relevantes e urgentes para o País -, alguns setores da oposição têm utilizado das funções do Estado brasileiro para clamar por impeachment - sem que tenha havido, até o momento, a abertura de qualquer procedimento inquisitivo nos moldes do devido processo legal - e golpe militar - sem que se precise dizer que, além de estarem obrigados a respeitar o Estado Democrático de Direito (art. 142 da Constituição Federal), como grupo de cidadãos, os representantes dos altos escalões das Forças Armadas já firmaram posição de respeito à Democracia, em que pese à dissidência interna (e velada) sobre o tema...


No Congresso Nacional, outro espetáculo: a personificação do ódio e da intolerância nas atitudes reiteradas do deputado federal Jair Bolsonaro, revela o ganho político que os comportamentos das redes sociais fomentam e reproduzem. Tal parlamentar clama, aos quatro ventos, os maiores impropérios contra todos aqueles que colocam em dúvida ou entram em desacordo ao seu "sistema de crenças", chegando a expor (abertamente) comportamento misógino, fundado numa percepção completamente equivocada do que venha a ser um parlamento; em vários episódios como esse, toda manifestação de pensamento contrária desperta, incontinenti, ataques verbais ultrajantes

Além disso, esses mesmos setores descontentes e seus locutores utilizam-se de adjetivações e imputações criminais ao Executivo da União e até a classificar todos os eleitores do Partido dos Trabalhadores de "criminosos" - caso protagonizado pelo candidato derrotado Aécio Neves -, como se opção política fosse motivo para se imputar conduta delituosa a qualquer eleitor. A escolha democrática tem que ser respeitada, quer seja fundada em interesses materiais conquistados por meio de políticas públicas assistencialistas, quer na ideologia do eleitor (sim, a velha ideologia de esquerda...), quer em qualquer outro motivo emocional, partidário, ou psíquico, ou, ainda, até decorrente da boa ou má formação política e educacional do cidadão.

Na linha das conhecidas argumentações defendidas pelos mais exaltados, segue a retórica da "população apavorada", no esteio da noção (equivocada e imprecisa) de que o atual ordenamento jurídico é o instrumento de excelência para a disseminação do crime e da desordem. Frases soltas, do tipo "Os direitos humanos só protegem bandidos" têm sido veiculadas abertamente, diante de uma população que, desta feita, por ignorância, desconhece a amplitude conceitual do tema dos Direitos Humanos - que albergam normas protetoras dos direitos políticos do cidadão, civis e políticos das crianças, da maternidade, dos idosos, dos trabalhadores (...) e, sim, dos investigados em inquéritos policiais e acusados em processos penais. Diante da inapetência do Estado em cumprir as normas constitucionais que contém as chamadas "sanções promotoras" (conforme classificação do autor italiano Norberto Bobbio, chamado a explicar sobre os fundamentos do Estado de Bem-Estar Social), vulgariza-se essa abordagem a respeito da proteção estabelecida por normas de direito interno e internacional que incidem sobre os direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.

Na contraposição a essas pontuações, está a brilhante defesa do Direito, da Ética e das instituições sociais organizada de forma bastante informal e didática pelo Prof. Haroldo Guimarães, mestre em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará. De uma maneira muito gentil e descontraída, os ensinamentos do Professor são claros: para a boa convivência social, é necessário um diálogo aberto, amistoso e racional, com o fito de preservação da malha social. Somente através do conhecimento (não só proporcionado pela Educação formal ou acadêmica) é que se torna possível uma verdadeira emancipação social, vez que tanto na política, quanto nas mais simples relações humanas vigoram as mais intrincadas e sutis emanações de Poder.

Ainda, a História revela que a personificação e o direcionamento do ódio para grupos sociais específicossempre resultou em atos de barbárie e que, para alcançar esse resultado, os grupos que os disseminavam se utilizaram de argumentos acríticos semelhantes aos expostos pelos defensores do ódio em Terra Brasilis. Vale ressaltar que o discurso de ódio sempre irrompe em momentos de crises (institucionais e econômicas), proporcionando Poder a seus propagandistas. 

Valendo lembrar que, em tônica muito resumida, aderir a esta ou aquela bandeira partidária e ideológica é um dos fundamentos da República; os ataques aos assim rotulados "comunistas", "marxistas", "bolivarianistas", "socialistas" e "gayzistas" (sic) têm se mostrado prática absolutamente intolerante e em descompasso ao pluralismo político consubstanciado no art. 1º, inciso V da Constituição Federal. Em outras palavras: ao invés de se construir uma oposição racional às ideologias e percepções de mundo contrárias aos seus interesses, esses grupos que discursam o ódio optam pela lógica do silenciamento e da censura, por meio da violência, numa sociedade na qual o espetáculo da brutalidade ganha cada vez mais adeptos. Ressalta-se: não é uma violência presumida da qual se fala, mas de uma que se apresenta na forma de violência física, psicológica e político-social, e sobre a qual somente o esclarecimento pode verter alguma luz - num explícito apelo ao modelo mais simples de Estado de Direito, fundado na razão.  

Portanto, mesmo que essa parcela "politicamente agressiva" da população seja inexpressiva, deve-se duvidar que o discurso que reverbera nas redes sociais não possa encontrar "ouvidos carentes" e, diante dessa orfandade acrítica, multiplicar-se. Silenciar diante desses atos significa: (i) tornar esses atores políticos os únicos e legítimos proprietários das soluções sociais, e (ii) conferir-lhes a atribuição exclusiva de identificar quais as verdadeiras causas da - e os (convenientemente) culpados pela - desorganização das instituições públicas e dos poderes constitucionais. Esse silêncio é, acima de tudo, um ato de omissão política inaceitável. 

***
Em homenagem ao Prof. José Haroldo Guimarães Filho.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Considerações sobre a "Constituinte Exclusiva para a Reforma Política" - por Fernando Castelo Branco

"Muita gente está me perguntando sobre a proposta de um Plebiscito para Constituinte Exclusiva relativa à Reforma Política. Bom, vamos lá:



"O Poder Constituinte Originário, que é aquele que de forma soberana, ilimitada e incondicionada, elaborou a Constituição promulgada em 1988, previu de maneira taxativa a possibilidade de alterações de seu texto. Repito para ser bem claro: previu de maneira TAXATIVA.

"Não há qualquer possibilidade de uma Constituinte Específica para a Reforma Política.

"O Congresso Nacional (e nunca a Presidente da República!) pode convocar um plebiscito acerca de uma nova Assembleia Nacional Constituinte? Pode sim. Mas nesse caso a Nova Constituinte teria poderes ilimitados e incondicionados para elaborar uma Constituição Inteiramente Nova, e não apenas para modificar o texto existente.

"O que Presidente da República fez foi pura retórica. Ela sabe melhor do que eu que a proposta é incostitucional.

"Lembrem-se: o Povo é titular permanente do Poder Constituinte Originário. Pode, a qualquer tempo, se dar uma nova Constituição. Constituinte com poderes originários é incondicional e ilimitada, portanto, não pode ficar restrita à alteração dos dispositivos que versão sobre direitos políticos e eleitorais. Constituinte com poderes derivados, é limitado e condicionada pelo texto da Constituição em vigor. E o texto em vigor não trata da possibilidade apresentada pela Presidente da República. Simples assim".

Fernando Antônio Castelo Branco Sales possui graduação em História pela Universidade Estadual do Ceará, licenciatura plena (2003), graduação em Direito pela Universidade de Fortaleza, bacharelado (2004) e mestrado em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (2008). Tem experiência na área de Ciência Política, com ênfase em Classes Sociais Democracia e Grupos de Interesse, atuando principalmente nos seguintes temas: direito, história e política externa e democracia.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Novas considerações sobre o STF e a crise institucional brasileira

Há poucos anos, o Procurador do Trabalho Francisco Gérson Marques de Lima, meu professor na Universidade Federal do Ceará, coordenador e amigo, lançou o livro "O Supremo Tribunal Federal na crise institucional brasileira". É uma obra de Sociologia Constitucional ímpar, lançando tema inédito na produção jurídica nacional, merecendo as melhores críticas e resenhas nacionais e internacionais. É a partir de sua leitura que escrevo as linhas infra, rendendo meus melhores cumprimentos ao dileto mestre alencarino.



Estamos assistindo ao julgamento de diversos escândalos, que têm (escândalos e julgamentos) abalado as estruturas institucionais brasileiras. Esse abalo consiste numa reverberação interna, relativamente à superestrutura que se estabeleceu a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso (que chamaremos de fernandismo) e que foi continuado pelos governos de Luís Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousself (que chamaremos de lulismo, tendo em vista que a atual Presidente da República não teve tempo de se afirmar como líder de uma política própria). Essa estrutura é promotora de uma profunda reorganização da máquina administrativa, que vai da alteração de regras de pensão à propostas de fim de estabilidade do funcionalismo público, por meio de argumentos classificados como neoliberais -- representando, na realidade, uma privatização do Direito e da Administração públicos. A justificativa para essas mudanças seriam (i) a necessidade de adequar o funcionamento do Estado ao século XXI e (ii) reduzir custos econômicos (neles considerados encargos sociais).

O que ocorre é que a República e suas instituições têm funcionamento complexo, ambivalente e ambíguo, refletindo uma diversidade de laços intersubjetivos que não são assim tão facilmente desfeitos e refeitos. Senão, vejamos o caso do julgamento do mensalão, utilizando o voto do ministro Toffoli, mas analisando o seu perfil como jurista.

Antes de tudo, convém esclarecer aos incipientes estudantes de Direito e ao público leigo que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) são nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovados pela maioria absoluta dos senadores - conforme regra exposta no art. 101, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988 (CF88). Como se vê, a escolha de um ministro do STF é política; esses juristas, homens e mulheres, embora não sejam eleitos, também não ocupam o cargo mais alto do Poder Judiciário brasileiro por mérito de concurso público. É exigido apenas que tenham notório saber político.

O ministro José Antônio Dias Toffoli, nascido em 1967 (hoje, com 45 anos) é exatamente isso: um jovem jurista, não habituado com os esquemas de Poder inerentes à atividade que exerce. Está sendo escrachado publicamente porque, no seu parecer, foi lacônico e considerado por muitos como impreciso/incompleto, ou desapropriado para um cargo tão importante. Bem, esse jovem foi escolhido no mandato do então Presidente Lula, e era uma aposta para a renovação Pretório Excelso brasileiro, para ser um dos guardiães da Constituição.

Entretanto, não podemos ser ingênuos e pensar que o STF realiza apenas julgamentos "jurídicos propriamente ditos. A Corte tem uma função política, e ela concentra-se principalmente na execução da teoria dos freios e contra-pesos - uma forma de fiscalização e exame recíprocos dos atos praticados entre as funções executiva, legislativa e judiciária, que foi incorporada historicamente e é uma de nossas tradições constitucionais mais importantes.

Ocorre que, não me parece estranho o ato do Sr. Toffoli, em defender aqueles que o escolheram para ocupar um cargo que é (nada mais nada menos) político. Talvez, o que esperássemos, como observadores dessa novela, seria um empenho do jurista que, na posição de magistrado da mais alta Corte, tivesse zelo no preparo de sua argumentação.

O que é importante aqui salientar é que o STF, na condição de Instituição estatal/social, é um dos órgãos que está inserido numa crise sistêmica. Isso significa que não podemos imaginá-los (os ministros, quer dizer, as pessoas que ali desempenham suas funções jurisdicionais) como pessoas isentas de uma co-participação política na atual crise. 

Inclusive, gostaria de lembrar ao leitor incauto que crise pode também significar vitalidade, na medida em que os atores nela envolvidos podem apresentar alternativas (modificando o atual modelo) e soluções (pequenos ajustes no modelo) que deem continuidade à vida de qualquer das instituições envolvidas nos esquemas de favorecimento financeiro em escrutínio e investigação, atualmente. Porém, é imperioso reconhecer que existem diversas forças sociais a acompanhar o deslinde desses atuais julgamentos. E alguns setores bem específicos, quer sócio-políticos, quer institucionais, ainda detém poder de fato suficiente para abalar as estruturas da atual Democracia.

Portanto, seria bastante útil à manutenção da Democracia que o STF realizasse um julgamento "jurídico propriamente dito" e condenasse às sanções penais, administrativas e civis, todos aqueles que comprovadamente participaram, direta e indiretamente, nos esquemas de desvio de verbas e cooptação política (lobby). Isso colocaria em risco à governabilidade, mas qualquer um(a) pode ser Presidente, mas nem todo governo é necessariamente Democrata.

sábado, 15 de outubro de 2005

Constituição comemora aniversário... brasileiro lamenta

Manchete publicada no aniversário da Carta Política brasileira: "Após 17 anos da Constituição Federal de 1988, editados mais de 3 milhões de leis"

"Nos 17 anos que a Constituição Federal de 1988 completou no último dia 5, o país foi palco de um verdadeiro festival de normas de todos os tipos. No total, Federação, Estados e Municípios editaram nada menos do que 3.434.804 leis ordinárias, decretos, normas complementares, medidas provisórias, emendas constitucionais e outros textos normativos, além da própria Carta Magna." (Publicado em Espaço Vital, em 11/10/2005).

São aproximadamente 554 leis por dia! 554 leis por dia, se considerarmos que os legisladores trabalham de segunda à segunda, sem sábados, domingos ou feriados (!) - o que sabemos ser uma inverdade. Diante disto, vou me limitar a fazer estas perguntas:
  1. Será que estamos diante de um sistema de leis estável?
  2. Nossos concidadãos têm condições de acompanhar uma produção legislativa dessa magnitude?
  3. Estamos diante de um Estado Democrático de Direito responsável e sadio?