As entidades patronais e a Comissão Européia elaboraram recentemente o Livro Verde sobre o Emprego na União Européia. Tal documento é uma carta de intensões contendo um estudo monetarista do mercado de trabalho europeu e um conjunto de "soluções" ao problema da competitividade européia.
Com efeito, desde o Tratado de Maastricht (1992) que a União vem sinalizando uma tendência profundamente neoliberal de, a longo prazo, implementar um mercado interno que seja suficientemente liberalizado para atender ao grau de competitividade no comércio internacional que faça frente às economias japonesa e norte-americana. Isso quer dizer que o pacto social estabelecido pelo plano Monet/Schuman "vai por água abaixo" e varre consigo o modelo social europeu. Dizendo de outra forma, não há mais interesse político em sustentar os resquícios do Estado Providência que ainda reverberam nos países da Europa continental, que vão paulatinamente aderindo ao modelo anglo-saxão de regulação das relações de trabalho.
Em recente conferência realizada em Lisboa (14/02/2008), a CGTP-In reuniu diversos representantes sindicais europeus e, não só, de vários países como, por exemplo, Vietnam, Cuba, Hungria, Rússia, Guiné, Brasil, Índia e França. O que pude perceber nas palavras dos conferencistas foi a óbvia conscientização das centrais sindicais no que respeita à orquestração que faça frente ao poder de organização das entidades patronais; daí a conclusão foi, também, evidente: os sindicatos precisam se globalizar e (re)politizar as relações laborais, tendo em vista a nova divisão internacional do trabalho. Num mundo de produção capitalista globalizada, aonde impera a sociedade da informação e do entretenimento, as centrais sindicais precisam estabelecer (logo!) um plano de formação do tipo BOTTOM-UP, ou seja, integrando o movimento sindical no palco dos outros movimentos sociais, fazendo, portanto, trabalho de base junto à população. Isso porque, como bem afirmou na altura o professor conimbricense António Casimiro Ferreira, o direito do trabalho é um bem integrante do patrimônio comum da humanidade; isso não reflete o velho apelo à construção histórica dos direitos dos trabalhadores, mas alerta para o fato de que esse conjunto de valores integram de forma profunda a cultura social dos povos europeus.
Os autores neoliberais argumentam que o sindicalismo afeta a eficiência econômica. Sim, está claro: afeta. Isso porque o paradigma econômico prima pelo incremento dos lucros do capital. Mas o que falta no discurso economicista é a manutenção de condições dignas de prestação do trabalho, segurança (dois tipos de segurança: ontológica e prática), e melhoria da qualidade de vida do trabalhador (com a melhoria constante do seu poder de compra). Ou seja, o discurso tanto da Comissão quanto da UNICE (agora BUSINESSEUROPE) esquece de rever o pacto firmado na constituição comunitária que inaugurou o modelo social europeu nos moldes do Acordo sobre a Política Social (do Tratado de Amsterdã). Isso porque, a procura da eficiência nos moldes da cultura anglo-saxã retira competências e funções estatais, transformando vários setores da vida em sociedade em mercadorias; se o primeiro setor a ser regulado é o trabalho, todos os produtos e serviços tornam-se mercadorias, e o trabalhador passa a ser um fator de produção (descartável, portanto).
Ainda, o Livro Branco foi elaborado sem a devida consulta aos parceiros sociais, o que evidencia o desrespeito ao estatuído no art. 136 e ss. do Tratado da União Européia (que regula o diálogo social). Ora, isso é um vício formal que põe por terra não só a legitimidade da medida praticada pela Comissão mas, ainda, configura uma extrapolação de competências de referida autoridade comunitária.
Ao fim e ao cabo, o maior problema que o modelo social europeu enfrenta é o discurso econorréico dos técnicos encarregados de implementar a flexicurity - à força bruta - no espaço comunitário. E, diga-se de passagem que, se este modelo protetivo europeu for por terra, estender-se-ão os braços do capitalismo selvagem por quase senão todas as regiões do globo, dificultando a instituição de direitos mínimos (antes considerados standards europeus) em outras regiões do mundo (como Ásia, África e América Latina).
Uma coisa é certa: as entidades sindicais não podem esperar até que a comoção social seja tanta que torne inviável o atual modelo de exploração. O que parece ser mais importante é uma ação social de conscientização de base, associada à já mencionada politização das relações sociais do trabalho: a cidadania laboral ou o reflexo da democracia nas relações de produção.
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