sábado, 21 de março de 2009

A Religião nos EUA, na visão de Barak Obama

Há tempos vínhamos arguindo que uma Casa Branca democrata com um presidente negro era um marco histórico global, mas ainda tínhamos dúvidas quanto a certas continuidades (práticas) do governo norte-americano. Porém, ao que tudo indica, haverá mesmo alguma progressão rumo a uma nova abordagem na universalização de valores humanísticos naquele país.

De fato, é importante destacar que a defesa de universalização de valores humanos é uma questão controversa, exatamente em razão do modelo ou paradigma de dignidade que diferencia cada prática humana. O "Mundo Ocidental" e o "Resto do Mundo" são duas metáforas que colhemos da modernidade, para descrever as dificuldades na equiparação do conceito de dignidade, quando ele é confrontado com valores das diversas culturas.


Ao que parece, a única via possível na consecussão dessa universalização é através do reconhecimento de diversas totalidades (cfr. Boaventura de Sousa Santos), isto é, partindo da idéia de que é preciso haver um diálogo transcultural, de reconhecimento e aceitação mútua de diferenças.

Nesse contexto de diferenças culturais, um dos elos mais fortes e importantes é a Religião (ou a faculdade humana em cultuar deidades e proteger um somatório de valores, práticas/ritos e costumes). Daí a importância do diálogo ecumênico (excluído o discurso hipócrita, hegemônico e arrogante do Ocidente, que deseja preponderar sobre e submeter outras religiões), que seja capaz de derrubar uma das mais profundas fronteiras: a religiosa.

Bem, penso que o intróito acima já basta. O vídeo que você assistirá a seguir é um "divisor de águas" na questão religiosa norte-americana -- pelo menos é a visão de Barak Russein Obama.


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Texto: Antônio T. Praxedes, doutorando em "Teoria do Estado, do Direito e da Administração Pública", no programa de doutoramento "Direito, Justiça e Cidadania no Século XXI" pela Universidade de Coimbra.
Vídeo: Cristiane S. Reis, doutoranda em
"Teoria do Estado, do Direito e da Administração Pública", no programa de doutoramento "Direito, Justiça e Cidadania no Século XXI" pela Universidade de Coimbra.

sábado, 14 de março de 2009

Reunião do G20 em Londres: o Sul global e as novas relações internacionais

Com o avanço do processo de globalização do sistema mundo de produção capitalista, deslocam-se as linhas abissais de apropriação/violência e regulação/emancipação. Essa é uma metáfora de Boaventura de Sousa Santos para explicar como estão se desenvolvendo as novas e algumas vezes perigosas dinâmicas neste início do século. A contínua expansão dos centros urbanos e o novo processo de destruição da cultura não-urbana (agrícola e de subsistência) vai alterando o panorama cultural, econômico e, como não poderia deixar de ser, a configuração do sistema de concertação internacional.

Nesse âmbito, é preciso reconhecer um duplo efeito: enquanto a desenvolvimento ou "progresso industrial" vai alcançando a periferia e semi-periferia do sistema mundo, a apropriação e violência começa a se reproduzir no núcleo duro do sistema. Esse câmbio não tem apenas uma natureza puramente econômica, embora possa-se afirmar que uma das principais forças a mover essa roda seja exatamente a deslocação da produção para o Sul. Mas o fato que nos interessa aqui é observar que houve uma mudança no discurso ou retórico-discursiva quanto ao papel dos países mais pobres dentro desse sistema.


Hoje e principalmente depois da nova crise econômica que se iniciou nos EUA no ano passado, os países do Norte declaram abertamente a necessidade de uma aliança com outros mercados e blocos econômicos, gerados principalmente pelos mercados e blocos econômicos asiáticos e latino americanos - que enfraqueceu a hegemonia Zona Euro e Norte-americana. É evidente que essa nova influência já havia provocado turbulências globais, como são exemplos a crise econômica que se iniciou na Argentina no fim dos anos 1990s, no México e Rússia no início dos anos 2000 e assim por diante. Ainda, depois da entrada da China na OMC, o hino em torno de um "livre mercado" e do fim das barreiras protecionistas colocaram em cheque não apenas os modelos de proteção do Norte, como interligaram e estabeleceram um equilíbrio na distribuição de riquezas ao redor do globo. Pena que essa distribuição de riquezas se deu apenas ao nível do Produto Interno Bruto, sem maiores efeitos na distribuição per capita real mas, pelo contrário, quer considerando os países do chamado "B.R.I.C.", quer os "Tigres Asiáticos", não é possível se dizer que se tenha construído um modelo de proteção social como o do Estado Providência europeu (que operou entre os anos 1950-1980).

Entretanto, mesmo diante dos dissabores trazidos pela contínua acumulação de riquezas (em nível interno), convém dizer que essa distribuição de riquezas ou recursos financeiros deu um novo fôlego aos países do Sul, principalmente ao nível das negociações internacionais sobre o comércio mundial. Tendo em vista que esses mercados menos desenvolvidos continuam a importar a tecnologia produzida no Norte e a exportar raw materials (agroindustriais e minerais) para esses mesmos mercados, o trade off é positivo do ponto de vista político, devido à maior independência em diversas áreas, principalmente na dos gastos sociais. Com maior poder de barganha, torna-se possível discutir melhores e menores tarifas sobre os produtos, garantindo muitas vezes uma valorização (positiva) na cotação dos principais produtos das balanças comerciais desses países.

Tanto isso se comprova, quanto se expressa na atual reunião do G20 em Londres, neste fim de semana. O Primeiro Ministro britânico Gordon Brown foi claro em seu pronunciamento esta manhão, quando afirmou que é preciso uma cooperação global para a regulamentação do mercado mundial - menos livre, portanto - e que é preciso haver um plano mundial de investimentos estatais nesta mesma antes livre e desregulamentada Economia Global.

Portanto, a luta agora é para que o novo modelo de regulação não sirva apenas para garantir privilégios aos antigos protagonistas do comércio mundial (o eixo anglo-saxão e a Eurozona). Os novos atores nesse cenário - os antigos figurantes - precisam tomar partido dessa nova configuração política e abandonar as antigas práticas subservientes do início do período pós-colonial. O momento agora é o de uma Nova Nova Ordem Mundial, menos neoliberal, mais intervencionista e mais emancipadora. O problema será o modelo de desenvolvimento desejado...

domingo, 8 de março de 2009

Contra o Dia Internacional da Mulher: por um Século das Mulheres

Criticar o Dia Internacional da Mulher é uma espécie de “batata quente” -- difícil de ser analisado, por falta de legitimidade de gênero. Embora exista uma razão histórica para o “evento” e ainda haja um conjunto de explicações à manutenção do habitus, existe um apanhado de questões que se colocam contra esta praxis social.

Contudo, antes de elaborar e discutir uma série de razões contrárias à comemoração do “afamado dia”, penso que a questão inicial é a da objetivação da mulher. Transformada em objeto, a mulher deixa de ser ator de transformação e passa a coisa manipulável num ambiente controlado, seguindo um processo de esteriotipização/castração. Acontece que esse processo a coloca numa posição subalterna, da mesma forma como a natureza na questão ambiental, ou dos trabalhadores e trabalhadoras na questão laboral: sempre objetos a serem preservados, tutelados, armazenados e etiquetados.


Seguindo essa linha de raciocínio, um dos primeiros efeitos negativos do “Dia” é o de colocar a mulher numa posição subjetivada de inferioridade. É cediço o fato de que existe violência contra a mulher – não sendo necessário estender muito essa narrativa. Também é evidente que a luta contra a discrminação é uma constante – na política, no ambiente de trabalho, na urbe… Mas celebrar um “dia para mulher” é uma dessas espécies de reducionismo características das sociedades ocientais, que tendem a vitimizar e a garantir um espaço de privilégios -- contanto que permanceça a exploração e a submissão da mulher em relação ao homem.

Além do mais, existe um outro motivo contra o “Dia” da mulher; é uma questão simbólica, descoberta mediante a formulação de uma simples pergunta: por que não há o “Dia Internacional do Homem”? Por que o sexo oposto também não possui um dia a ser celebrado? A resposta para isso é tão cínica como verdadeira: ainda vivemos num mundo aonde o sexo masculino predomina socialmente. Por isso não há a necessidade de um “Dia” para os homens. Reconhecer essa situação é tomar conciência do processo descrito no parágrafo anterior, sendo mesmo desconcertante ter que dizer que a luta feminista ainda dá os primeiros passos na consecução de um objetivo mais amplo a ser conquistado: o fim do poder masculino e o começo de um poder paritário.

Portanto, é preciso dizer um grande e ensurdecedor “NÃO” ao Dia Internacional da Mulher, pela constante re-afirmação de um novo século de paridade de poderes entre homens e mulheres. Esse é um dos caminhos a serem percorridos na construção de sociedades aonde não haja mais espaço a discriminações mas, pelo contrário, de reconhecimento de totalidades, fora da lógica maniqueísta da “grande sociedade contemporânea ocidental”.