segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Crise financeira e mídia, ou o Sol e a peneira

As explicações sobre a atual crise financeira pululam na mídia internacional. Acusações e desculpas correm por todos os lados, e culpados há muitos -- claro, dentre os que apostam no mercado financeiro. Nesse contexto, ao que tudo indica, cada grupo/empresa de comunicação social parece querer defender esta ou aquela "melhor explicação" para o fato de que eu, você ou todos nós vamos arcar com os prejuízos do esquema de enriquecimento ilícito praticado pelos grandes bancos do sistema financeiro global.

Por que a BOVESPA e outras bolsas de valores estão em queda? Porque os investidores internacionais estão exigindo a liquidez de seus títulos, porque o sistema financeiro internacional está na bancarrota. Em Agosto deste ano o FED (Banco Central dos EUA) já havia emprestado em torno de US$ 2 bilhões a quatro grandes bancos norte-americanos (Bank of America, JP Morgan Chase & Co, Citigroup e o Wachovia Corp.), e no começo deste mês de Outubro já havia anunciado um pacote de US$ 700 bilhões para salvar outros bancos do destino do Lehman Bros., ou seja, a falência.

Não há necessidade de explicações "mágicas" ou mirabolantes: o sistema ruiu. E a culpa reside nas "expectativas racionais" dos CEO's que, em busca de lucros e através de uma verdadeira "pirâmide financeira", conseguiram empréstimos financeiros e deram como garantias os passivos que tinham a receber, isto é, as dívidas sobre empréstimos de consumidores e clientes desses mesmos bancos.

Por um lado, apesar de estar pacificamente demonstrado que o colapso econômico que se propaga ao redor do mundo está intimamente ligado à captação de alto risco praticada por grandes bancos norte-americanos e ingleses (que inundaram o sistema financeiro global com garantias fictícias), a Folha de São Paulo parece querer adotar um «"jornalismo" autêntico», confundindo os efeitos com as causas -- como estabelece " o porquê disso" da reportagem que se lê aqui.

De outro lado, o que se pode perceber no conjunto dessas reportagens "bem orientadas" é que, ao que tudo indica, os governos devem mesmo intervir na saúde econômica. Só que as medidas econômicas concentram-se em garantir a rentabilidade a saúde dos bancos, na medida em que essas instituições seriam indispensáveis ao correto funcionamento do sistema econômico.
  • Minhas perguntas:
Havendo imperícia, negligência ou imprudência, não há necessidade de reparação? Qual o limite da culpa dos indivíduos que movimentaram esse "esquema"? Não haveria uma norma sequer, a regular essas atividades (a nível nacional, regional ou internacional)? Não seria possível fazer um julgamento político dessas instituições e limitar-lhes esse poder absoluto? Para que(m) trabalha o Estado afinal?
  • Minhas questões:
1) Qual é o motivo de tanta cautela midiática? Um dos motivos seria evitar o pânico entre os consumidores -- e uma inevitável e infrutífera corrida aos bancos, para retirada de aplicações, investimentos, poupanças e valores em conta corrente. Outro motivo seria tentar reverter o irreversível, na esperança de ressuscitar o já pútrido mercado de ações global. Neste item, há vasto campo para especulações - desculpe-me o trocadilho.

2) Se não há tanta cautela, contrariando o dito anteriormente, por que a linguagem utilizada na mídia é o "Economês"? Porque existe uma profunda ligação entre a linguagem e o Poder. Quem controla uma determinada linguagem acaba por exercer o controle sobre um determinado tema, e na seara econômica, os termos utilizados são "trade-off", "hedge", "sub-primes". Sim: a economia fala inglês. Some-se a isso as incompreensíveis siglas -- irreproduzíveis e inúteis neste momento.

3) Por que encobrir uma mudança na atitude política do Estado frente à Economia? Porque é preciso garantir que o nível de confiança da população mundial no sistema permaneça minimamente estável -- inclusive para que o sistema possa ser "reiniciado", para usar uma expressão da Informática. Porque o sistema tem funcionado com intervenções pontuais (ditas mínimas) do Estado durante quase 30 anos -- atuação necessária para garantir a saúde de grandes empresas e corporações multinacionais. Porque há um crescente receio e uma preocupação constante que esse "reinício" seja marcado por uma "grave" agitação social -- que altere profundamente as "regras do jogo".

Entretanto, convém advertir que mesmo que existe um sistema exo-congruente ao sistema financeiro, a gerir todo esse processo de (re)inserção do Estado na Economia: o sistema Jurídico. Pelos princípios consagrados neste campo, toda e qualquer instituição "social", quer por destinação originária, quer por contingência, está imersa sob o controle e diante do exercício da legalidade. Ainda, se os atos jurídicos devem estar conforme à legalidade, havendo ruptura da harmonia desejada (a violação do Direito), é necessário apurar a autoria da ação danosa, a extensão da culpa dos autores e os eventuais danos causados.

Portanto, digam o que quiserem, os jornais e seus repórteres -- os jornalistas estão ausentes (?). O que se torna inadmissível é não haver a responsabilização de diretores e presidentes das instituições financeiras que organizaram essa ciranda financeira, porque o resgate desse prejuízo é pago com dinheiro público.

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